A importância da estação espacial

A importância da estação espacial
A cooperação internacional de forma consequente, como na estação, promove o nosso desenvolvimento
MÁRCIO NOGUEIRA BARBOSA

O debate pela comunidade científica brasileira em torno da decisão do governo de participar da Estação Espacial Internacional dá à sociedade a chance de conhecer melhor o programa espacial brasileiro. O convite para a adesão do Brasil ao programa partiu da Nasa, em dezembro de 96. O estágio de maturidade adquirido pelo país na área tecnológica, tanto em pesquisa e desenvolvimento como na indústria, colocou-nos na condição de possíveis parceiros. O desenvolvimento de satélites, veículos lançadores e infra-estrutura de lançamento e rastreamento em órbita, com intensa participação da indústria brasileira, foi considerado pela Nasa.Fator primordial para essa parceria foi a credibilidade internacional recuperada pelo país (a partir de atos e declarações do governo Fernando Henrique); quanto à observação dos princípios do uso pacífico do espaço exterior. É incompreensível, portanto, a dificuldade que o programa espacial brasileiro ainda tem de obter apoio, por parte dos EUA, para o desenvolvimento de veículos lançadores e a comercialização de serviços de lançamento. O governo trabalha para resolver essa pendência.Uma intensa negociação entre os dois países sobre a participação brasileira na estação espacial ocorreu no período de janeiro a setembro de 97. O Brasil foi representado por especialistas designados pelo conselho superior da Agência Espacial Brasileira, que inclui representantes da comunidade científica e do setor industrial. Tudo foi feito com transparência e competência. O processo de negociação foi acompanhado por representantes do Congresso e de vários partidos (PSDB, PMDB, PFL e PT);. Em outubro de 97, após aprovação do conselho superior da AEB, por ocasião da visita do presidente Bill Clinton ao Brasil, a adesão foi formalizada, por meio de acordo em nível de governo.O acordo estabelece os itens que devem ser fornecidos pelo Brasil e o tempo e o espaço de uso que teremos na estação durante sua vida útil, estimada em pelo menos dez anos a partir de sua conclusão, em 2003. Não há, no acordo, cláusula de transferência de recursos financeiros do Brasil para os EUA ou de pagamentos ao exterior.Os seis itens de responsabilidade brasileira foram escolhidos por comum acordo e baseados na capacitação (de projeto e fabricação); existente na indústria nacional. O valor inicial estimado para isso foi de US$ 120 milhões. Pode haver variações em decorrência das próprias condições de fabricação no Brasil, mas o gasto total não atingirá valores substancialmente maiores (como os que vêm sendo citados, até US$ 300 milhões);. Como o desembolso ocorrerá num período de quatro ou cinco anos, os gastos anuais deverão ficar em torno de US$ 30 milhões _ou seja, compatíveis com os dispêndios atuais em ciência e tecnologia no país. Neste ano, não obstantes as grande dificuldades orçamentárias, lançaremos em órbita três satélites (o primeiro da cooperação espacial com a China e os dois iniciais da série científica, um deles a bordo do segundo protótipo do nosso Veículo Lançador de Satélites, partindo de Alcântara);. É importante mencionar que a Embraer, empresa pré-selecionada para atuar, do lado brasileiro, como "prime contractor", já apresentou sua proposta ao governo, envolvendo praticamente todas as empresas nacionais do setor aeroespacial.Paralelamente, o Ministério da Ciência e Tecnologia, por meio da Finep, discute com a Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil mecanismos de apoio à maior capacitação nacional no setor. Espera-se que, ao final da fase de fabricação dos itens, a Embraer e várias indústrias estejam capacitadas para o fornecimento internacional de hardware e software a missões tripuladas. Empregos de alta qualificação no país e exportações são, portanto, os dividendos esperados.Quanto ao interesse científico do projeto, a Academia Brasileira de Ciências já está realizando workshops para discutir projetos e oportunidades que surgirão como decorrência do tempo e do espaço que teremos nesse laboratório único. A decisão de usar ou não essa oportunidade não pode se basear apenas em alguns insucessos científicos nas missões do ônibus espacial, já que houve também muitos sucessos. O tempo de vôo dos ônibus espaciais é da ordem de apenas 12 dias, e a infra-estrutura a bordo é limitada; na estação, os experimentos que requerem longa duração (três meses, por exemplo); poderão ser feitos e acompanhados de perto por um cientista. Aí entra em cena o interesse de termos um astronauta a bordo. O primeiro a ser treinado em Houston é o major-aviador Marcos Pontes, escolhido por ter, entre outros aspectos, qualificações científicas na área de sensores e materiais. A cooperação internacional de forma consequente, como é o caso da estação, insere-nos em outros mercados e promove o nosso desenvolvimento. Márcio Nogueira Barbosa, 47, engenheiro, é diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais); e membro do conselho superior da Agência Espacial Brasileira.